Sempre que algum atleta português ganha uma medalha, como que cada um de nós sobe ao pódio com ele. Temos orgulho em todas as medalhas, mas há medalhas que tem outro sabor…a medalha que Iúri Leitão conquistou esta semana em Paris é uma delas.
Foi medalha de prata em omnium (ciclismo de pista), uma modalidade que é constituída por quatro provas, onde a estratégia e a resistência são qualidades, entre outras, essenciais para vencer. Vence o melhor no conjunto das provas.
O nosso Iúri chegou a Paris campeão do mundo nesta modalidade, e com sequelas de uma queda, lutou com bravura e com inteligência, o que levou a conquistar a medalha de prata, logo atrás do francês Benjamin Thomas. Mas esta medalha poderia ter sido de outra cor (ouro). Contudo, há um gesto que Iúri tem para com o atleta francês, seu directo rival, que na sequência de uma queda deste, marca o valor desta medalha, ele mesmo refere: “Fiz questão de saber que ele estava bem e que poderíamos discutir o ouro de forma justa. Ele teve um azar. Seria injusto ele perder o ouro daquela forma. Quis ter a certeza de que ele voltava e que estava bem. Na minha consciência fiquei aliviado quando soube que ele estava ok e poderíamos continuar a nossa batalha. Foi o mais justo”.
Eis um gesto que distingue o valor desta medalha. Gesto este que eleva o desporto para a sua essência de ser uma prática e exercício de valores. O desporto não é só competição (agón), exercício, luta ou recorde, é também superação individual, vencer de forma justa e limpa, é também afirmação de uma ética. Um conjunto de valores e princípios que orientam o nosso comportamento no sentido correcto.
Contrariamente à lei, a ética remete-nos para a nossa consciência (lei interna), tal como refere o Iúri, “na minha consciência fiquei aliviado (…) foi mais justo” por outras palavras “não poderia ganhar nestas circunstâncias“.
Aliás, é isso mesmo que afirma mais tarde à RTP: “O respeito e a ética têm de estar acima de tudo (…) acima de tudo temos de ser boas pessoas”. É esta rectidão e justiça que nos deixa dormir descansados, que enobrece a medalha ganha e que a torna “limpa e nobre”.
A justiça e a rectidão são princípios que devem nortear os nossos gestos. Numa sociedade cada vez mais competitiva e hedonista, em que o desporto de alta-competição, muitas vezes, é reflexo deste sentir, é importante que atitudes com a do Iúri sejam divulgadas, como exemplo positivo junto dos mais novos. Para que se possa dizer que há sempre maneira de con(vencer) com valores!