Investir na saúde pública: para um futuro com mais saúde

A pandemia de covid-19 transformou profundamente a perceção social da saúde pública, elevando-a para o centro da agenda global e destacando a sua importância para políticos, instituições, empresas e cidadãos. Em 2020, Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial da Saúde, sublinhou que a saúde pública é um direito humano fundamental e a base da estabilidade social, económica e política. Pouco mais de um ano depois de ter sido declarado o fim desta emergência global, é imperativo capitalizar as lições aprendidas, valorizar o reconhecimento social e manter o investimento na saúde pública, fortalecendo a capacidade de enfrentar os desafios globais e aumentar os ganhos em saúde das populações.

Neste contexto, a Escola Nacional de Saúde Pública da Universidade Nova de Lisboa (ENSP Nova) desafiou mais de 80 parceiros de setores públicos, privados e sociais de múltiplos sectores, incluindo especialistas nacionais e internacionais, para num processo colaborativo criar o Papel branco [Livro Branco] em Saúde Pública, intitulado “Liderando o caminho para um futuro saudável – Inovação ao Serviço da Saúde Pública”. Este documento não pretende ser mais um diagnóstico de situação, mas um recurso que convoca à ação. Deste trabalho conjunto resultam dez recomendações construídas com base num consenso alargado, complementadas com ações prioritárias e facilitadoras para colocar a inovação ao serviço de uma saúde pública que faça a diferença e cumpra a missão de garantirmos um futuro saudável e sustentável para as comunidades de hoje, mas também para as gerações futuras.

Vivemos tempos de grandes desafios e oportunidades, e o nosso país, como muitos outros, enfrenta questões complexas e interligadas: mudanças climáticas e sustentabilidade ambiental, a pressão crescente do envelhecimento populacional e das doenças crónicas, emergências de saúde pública e resistência antimicrobiana, governança e sustentabilidade económica e social. É inequívoca a necessidade de uma transformação das políticas e do sistema de saúde para garantir a saúde, o bem-estar e a sustentabilidade económica, social e ambiental do nosso país.

Com recursos limitados é, contudo, vital definir prioridades claras. Assim, identificámos conjuntamente áreas prioritárias: transformar positivamente as políticas e os sistemas de saúde, criar comunidades mais saudáveis, robustecer a força de trabalho em saúde, e desenvolver a inovação, empreendedorismo e transformação digital em saúde.

O Papel branco [Livro Branco] coloca os cidadãos no centro das políticas de saúde, destacando a participação cidadã e a colaboração intersectorial como essenciais para criar um sistema de saúde mais resiliente e inclusivo. A inovação, empreendedorismo e transferência de conhecimento desempenham um papel crucial, não apenas na criação de soluções, mas no envolvimento ativo dos cidadãos e na capacidade efetiva de as colocar ao serviço das necessidades reais em saúde. A integração de ciência de dados, inteligência artificial e ciências sócio-comportamentais foram igualmente identificadas como fundamentais para decisões mais informadas e ágeis.

A importância da transformação dos sistemas de saúde para enfrentar desafios emergentes e abordar problemas sistémicos foi definida como vital, abordando áreas da gestão em saúde, organização, modelos de liderança e força de trabalho em saúde. Foi também saliente a necessidade de respostas integradas do ecossistema social e económico.

Além das recomendações já referidas, destaca-se a importância do desenvolvimento de uma política de promoção da saúde e de literacia em saúde ativa, eficaz e participada, que apoie a capacitação das comunidades e indivíduos ao longo do ciclo de vida, mas também a criação de contextos favoráveis à saúde. Para isso, é essencial integrar setores tradicionalmente menos envolvidos nas políticas de saúde, como educação, administração pública, justiça, meio ambiente, trabalho, cultura, habitação, transportes e segurança social, priorizando a adoção de uma abordagem “Uma Saúde“, que considera a saúde humana, animal e ambiental como interdependentes.

Este trabalho colaborativo inédito é um exemplo de como a abertura da academia à sociedade se pode tornar na força motriz que ultrapassa fronteiras e quebra a forma tradicional de trabalho em “silos”. A ENSP Nova, enquanto recém-nomeada pela Organização Mundial da Saúde como Centro Colaborador para a gestão em saúde, e tendo visto também renovada a designação como Centro Colaborador para a educação, investigação e avaliação da segurança e qualidade em saúde, posiciona-se como parceira ativa na construção de uma melhor saúde para todos – um caminho que começa na formação de lideranças e profissionais com um conhecimento científico de excelência e competências adaptadas às necessidades presentes e futuras na saúde global.

Em resumo, este Papel branco é um apelo à ação. Convoca todos os setores da sociedade a unirem-se num esforço colaborativo para transformar a saúde pública em Portugal. Acreditamos que podemos criar um futuro mais saudável e sustentável para todos, construindo um sistema de saúde resiliente e eficaz, capaz de enfrentar os desafios futuros e colocando sempre a saúde e o bem-estar dos cidadãos no centro de todas as ações.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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